Ó Paisagem nua, Dor! - Monólogos Franjhunio

terça-feira, 7 de setembro de 2010

7 de Setembro - Garotos Podres

Quando eu era uma criança Implorava pro meu pai me levar Pra ver o desfile da independência Sentia orgulho de ser um mini patriota Mas agora eu cresci E vejo mais um motivo idiota Para mostrar Armamentos antiquados Soldados mal treinados Tanques enferrujados Sete de setembro Data tão festiva Mais uma piada Dessa terra tão querida Sete de setembro Data tão festiva Mais uma piada Dessa terra tão querida Para mostrar Armamentos antiquados Soldados mal treinados Tanques enferrujados Sete de setembro Data tão festiva Mais uma piada Dessa terra tão querida Sete de setembro Data tão festiva Celebrar a farsa Dessa terra tão querida Sete de setembro Data tão festiva Mais uma piada Dessa terra tão querida Sete de setembro Data tão festiva Mais uma piada Dessa terra tão querida Terra tão querida

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Assunto que mais gosto...


Faz mais de um século e meio que Darwin e Wallace desvendaram a parte essencial do mistério humano. Ou seja, Darwin e Wallace acabaram com o enigma humano e outros sustos da psicologia* monoteísta. A Ciência reiteradamente tem nos dito que somos o resultado de um processo natural evolutivo, e não um design metafísico.

Já em pleno gozo do tão festejado Século XXI, temos todas as chaves para nos libertar das bruxas e libertar as bruxas de nós. Temos todas as bases racionais para superar a idéia do bem e do mal metafísicos, dar esta fase de psicose** coletiva como encerrada e seguir em frente, sob uma ordem menos assombrada.

Não estou defendendo aqui um “ateísmo engajado”, porque não acho que este seja o caminho mais proveitoso. Não acredito na eficácia desse método. Minhas questões aqui também não pretendem atacar Dawkins, ou Clément Rosset, ou Saramago, ou Michel Onfray e tantos outros, até porque não quero me enveredar por esse caminho. Caso contrário eu teria que me debruçar sobre uma montanha enfadonha de epistemologias “teo-atéias” que existem por aí, muitas delas indecisas. Na prática, elas só desviam o foco da questão central.

Creio que avançaríamos muito mais se retomássemos as idéias dos pensadores do século XIX. Ainda que isto possa encerrar alguma coisa de paradoxal. Retroceder para avançar (acho que Sun Tzu já disse algo assim).

Há mais de um século, pela voz de Nietzsche, a cultura humana anunciou numa constatação: “Deus está morto”! Nunca existiu ato mais grandioso, e, quem quer que nasça depois de nós, passará a fazer parte, mercê desse ato, de uma história superior a toda a história até hoje! Disse Friedrich Nietzsche, em A Gaia Ciência (1882) – trata-se de uma alegoria. A leitura disso é trivial, mas vale a pena repetir: não foi Nietzsche nem ninguém que “matou Deus”, a evolução do conhecimento humano é que superou a idéia de Deus, Nietzsche apenas anunciou essa constatação.

Há aqueles que argumentam, eu por exemplo, que a espiritualidade, resumida na ideia de Deus, é parte da essência humana. Mas por outro lado eu defino a espiritualidade e, portanto Deus, como um efeito colateral da inteligência humana. Não precisamos negar nossa espiritualidade, precisamos apenas domá-la, como domamos nossos instintos, senão continuaremos domados por ela e, portanto, vassalos daqueles que sabem manipular estas fraquezas humanas.

Há ainda aqueles que argumentam que “tirar Deus do homem pode causar danos irreversíveis em seu hardware”. Numa população encabrestada e amedrontada pelos dogmas, pode ser. Mas não o será em uma população que, desde cedo, tenha educação de qualidade e esteja livre de maniqueísmos metafísicos.

Há um limite neste atual estágio de evolução do intelecto humano, da psique humana. Considero que, em relação à nossa espécie, existem pelo menos três linhas evolutivas: a evolução do bicho, mamífero, primata; a evolução tecnológica; e a evolução da psique humana, do intelecto. Esta última, acredito, no atual estágio em que nos encontramos, é afetada negativamente pela espiritualidade indomada. Se ela foi importante em um passado remoto, como fator de agregação social (às vezes de desagregações e guerras), no presente ela é um obstáculo. Creio que se não domarmos a espiritualidade, mudando a forma como lidamos com ela, não vamos mais avançar como poderíamos e deveríamos. Muito menos sair dessa caverna imunda, da qual Platão nos advertiu.

É preciso entender também que, com ou sem hardware danificado, alguns “sacrifícios” intra-específicos são parte da tônica da evolução das espécies. Foi assim e é assim com a evolução de todas as espécies que habitaram, habitam, e hão de habitar este planeta. Quando não declinam para a extinção, as espécies sofrem as pressões da evolução e ponto final!

Porque é desalentador constatar a realidade humana. Ainda que toda A Caverna (de Platão) esteja iluminada pelo conhecimento, o humano ainda é, em essência, reticente. Ainda não há massa crítica suficiente e bem formada. Isto, mais de um século depois de Nietzsche anunciar a morte de Deus em A Gaia Ciência e depois de Carl Sagan nos advertir com o seu didático O Mundo Assombrado Pelos Demônios (1997). Talvez a mais brilhante e objetiva obra de divulgação científica de todos os tempos. Nela, Sagan faz uma exposição didática excepcional do Método Científico e demonstra como ele é sistematicamente ignorado pela maior parte da população.

Pior que isso, a ciência é sistematicamente subjugada, intencionalmente, por “lideranças” em busca de prestígio e poder, trabalhando para produzir uma massa ignorante de pessoas desinformadas, amedrontadas, emocional e materialmente carentes, sem capacidade crítica. E “nossa” dependência de Deus é usada e abusada inescrupulosamente por tais “lideranças” na feira da busca pelo Paraíso, o mercado da salvação das almas. Um filão inesgotável de riqueza material, prestígio e poder, em benefício de poucos e sacrifício de muitos.

Sagan argumenta em seu livro que a desinformação e a falta de capacidade crítica constituem um grande perigo para a sociedade. E demonstra, em linguagem absolutamente acessível, como o pensamento cético, a razão e a lógica devem prevalecer em favor da verdade, aquela que Nietzsche brilhantemente já havia proclamado ser relativa. Sagan demonstra como estas ferramentas são essenciais para descortinar pseudociências, fraudes, superstições, dogmas religiosos, cura pela fé, deuses, bruxas, percepção extra-sensorial, discos voadores (OVNIs) e outros argumentos que não se sustentam sob o escrutínio da ciência, da razão e do bom senso.

Observe que o primeiro lampejo do pensamento científico é atribuído ao grego-jônio Tales (séc. VI a.C.), em Mileto. A “Grécia” de então era, nada mais nada menos, do que um grupo de Cidades-Estado, sem relevância política, ocupando um território de topografia fragmentada ao longo do Mar Egeu. O único fator que as unia era o domínio da mesma língua. Aquela região não tinha nem mesmo um nome comum, o epíteto Grécia lhe foi dado pelos romanos. Estavam em um estágio inicial de desenvolvimento social, cultural e religioso. Sua religião consistia de um amontoado de deuses sem muita importância ocupando o Monte Olimpo. E aí reside um detalhe revelador. Era, portanto, um povo livre de religiões dogmáticas. Seus deuses eram semelhantes aos homens e não o contrário.

Para as religiões dogmáticas o homem foi criado à semelhança de Deus. Na Grécia os deuses foram criados à semelhança dos homens. Então, os gregos eram livres para questionar o mundo e o universo segundo sua própria razão.

E Tales fez o primeiro “tento” – “por que as coisas acontecem como acontecem?” – Mais importante ainda que a pergunta, foram as tentativas de respostas livres de um deus onisciente e onipresente. Este pensamento livre foi tão importante que iria influenciar toda a cultura ocidental dali para frente, e a Grécia se tornaria a referência cultural mais importante da civilização humana. Com reflexos em todos os campos, como artes, religião e ciência. Algumas vezes, quando este pensamento era tomado como verdade absoluta e associado a religiões dogmáticas, como foi o caso do modelo proposto por Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C), em vez de contribuir, atrasou o desenvolvimento científico.

Mas creio que dificilmente chegaremos a esse futuro superior, imaginado por Nietzsche e extraível daquilo que é didaticamente descrito por Sagan. Os obstáculos são muitos: os interesses espúrios, a covardia, a hipocrisia, a Educação que deveria ser A prioridade civilizatória e não é...

Vejam que estamos contabilizando a primeira década do Século XXI, ou seja, esta epopéia humana, de contornos babilônicos, fantasticamente está chegando ao ano 2010 do calendário gregoriano. Mas tristemente ainda evitando reconhecer e aceitar que a forma como lidamos com a espiritualidade é um grande obstáculo. Evita-se reconhecer a necessidade de levar a civilização a um estágio mais avançado, como definido por Nietzsche. Some-se a isto os modelos econômicos experimentados até agora, o socialismo-comunismo falido (todos eles consumaram A Revolução dos Bichos – o Brasil é o exemplo mais recente), o capitalismo predatório, a exploração de muitos por poucos, alargando as desigualdades sociais. E a “ordem estabelecida”, política e econômica, invariavelmente ligada ao poder das igrejas, das religiões, que se sustentam na ignorância do povo, e a ignorância do povo atrelada à espiritualidade indomada.

Portanto, com racionalidade, educação e bom senso, poderíamos considerar a possibilidade de um mundo pouco poluído, pouco degradado, com seus recursos naturais sendo racionalmente explorados, com uma população em número compatível com os recursos disponíveis, ou seja, poderíamos, em bases palpáveis, vislumbrar a possibilidade real de um mundo limpo e largo para todos.

Mas a humanidade ainda segue mergulhada em um mundo de escuridão. Um mundo ainda assombrado e assolado por demônios. Com Deus protegendo a integridade do hardware humano (?). E o mais inacreditável, paradoxal e absurdo disso tudo é que, desta vez, estamos vagando por este mundo em trevas com todos os faróis em nossas mãos, evitando acendê-los noite após noite, com medo da luz.

___________________________
(*) psicologia:
3 Conjunto de estados e processos mentais de uma pessoa ou grupo de pessoas, especialmente como determinante de ação e comportamento: A psicologia das massas.

(**) psicose:
2 Inquietação mental extrema de um indivíduo ou de um grupo social: Psicose de guerra.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Na madrugada sem papo chuto uma pedra e é um sapo!


Fui um menino introspectivo. Parentes e amigos dos meus pais, viviam dizendo que eu era muito observador, caladão e mal chamava atenção. Gostava mesmo de escrever. Isso deve ser a única constante em minha vida, além da queda de cabelos. Todos sempre acharam que era inteligente, mas pessoalmente fora o hábito de ler nunca fui um gênio.

Hoje, continuam me achando inteligente. Mantenho minha opinião. Não me acham mais caladão e nem introspectivo, mas pessoalmente, acho que ainda sou. Há até quem me considere sociável, espirituoso e engraçado. Xande uma vez me disse que eu era "o cara". Me achei o Lula...

As vezes acredito que só banco o sujeito sociável como um personagem. Não sei se sou assim. Tem vezes que me considero mesmo aquela criança quieta, calada e observadora. Ao menos, ainda gosto de escrever.

Por isso quero escrever um livro. É só isso. Quero, desejo, almejo, planejo, mas nunca consigo. Cheguei a começar um, mas não consigo ir em frente. O motivo varia entre a crise criativa, falta de tempo, excesso de informação para absorver e excesso de atividades incluindo textos. Enfim, quase uma overdose de parágrafos.

Se já há tempo em fazer promessas para 2011, esta é a minha primeira: ler menos e focar mais no que quero escrever. A vida é curta e, por incrível que pareça, dá pra fazer quase tudo que a gente realmente quer. É só se organizar.

Franjhunio

terça-feira, 4 de maio de 2010

Depilação Masculina


Estava eu assistindo tv numa tarde de domingo, naquele horário em que
não se pode inventar nada o que fazer, pois no outro dia é segunda-feira, quando minha esposa deitou ao meu lado e ficou brincando com minhas
"partes". Após alguns minutos ela veio com a seguinte idéia: Por que não depilamos seus ovinhos, assim eu poderia fazer "outras coisas" com eles. Aquela frase foi igual um sino na minha cabeça. Por alguns segundos fiquei imaginando o que seriam "outras coisas". Respondi que não, que doeria coisa e tal, mas ela veio com argumentos sobre as novas técnicas de depilação e eu imaginando as "outras coisas" não tive mais como negar. Concordei.
Ela me pediu que ficasse pelado enquanto buscaria os equipamentos necessários para tal feito. Fiquei olhando para TV, porém minha mente estava vagando pelas novas sensações que só acordei quando escutei o beep do microondas. Ela voltou ao quarto com um pote de cera, uma espátula e alguns pedaços de plástico. Achei meio estranho aqueles equipamentos, mas ela estava com um ar de "dona da situação" que deixaria qualquer médico urologista sentindo-se como residente. Fiquei tranqüilo e autorizei o restante do processo. Pediu para que eu ficasse numa posição de quase-frango-assado e liberasse o aceso a zona do agrião.

Pegou meus ovinhos como quem pega duas bolinhas de porcelana e começou a passar cera morna. Achei aquela sensação maravilhosa!! O Sr. Pinto já estava todo "pimpão" como quem diz: "sou o próximo da fila"!! Pelo início, fiquei imaginando quais seriam as "outras coisas" que viriam. Após estarem completamente besuntados de cera, ela embrulhou ambos no plástico com tanto cuidado que eu achei que iria levá-los para viagem. Fiquei imaginando onde ela teria aprendido essa técnica e prazer: Na Tailândia, na China ou pela Internet mesmo. Porém, alguns segundos
depois ela esticou o saquinho para um lado e deu um puxão repentino. Todas as novas sensações foram trocadas por um sonoro PUUUUTA QUEEEE O
PARIUUUUUUU
quase falado letra por letra. Olhei para o plástico para ver se o couro do meu saco não tinha ficado grudado. Ela disse que ainda restaram alguns pelinhos, e que precisava passar de novo. Respondi prontamente: Se depender de mim eles vão ficar aí para a eternidade!!

Segurei o Dr. Esquerdo e o Dr. Direito em minhas respectivas mãos, como
quem segura os últimos ovos da mais bela ave amazônica em extinção, e fui
para o banheiro. Sentia o coração bater nos ovos. Abri o chuveiro e foi
a primeira vez que eu molho o saco antes de molhar a cabeça. Passei alguns
minutos só deixando a água gelada escorrer pelo meu corpo. Saí do banho, mas nesses momentos de dor qualquer homem vira um bebezinho novo: faz merda atrás de merda. Peguei meu gel pós barba com camomila "que acalma a pele", enchi as mãos e passei nos ovos. Foi como se tivesse passado molho de pimenta.

Sentei no bidê na posição de "lava xereca" e deixei o chuveirinho acalmar os Drs., peguei a toalha de rosto e fiquei abanando os ovos como quem abana um boxeador no 10° round. Olhei para meu pinto. Ele tão alegrinho minutos atrás, estava tão pequeno que mais parecia irmão gêmeo de meu umbigo. Nesse momento minha esposa bate na porta do banheiro e perguntou se eu estava passando bem. Aquela voz antes tão aveludada e sedutora ficou igual uma gralha .

Saí do banheiro e voltei para o quarto. Ela estava argumentado que os pentelhos tinham saído pelas raízes, que demorariam voltar a nascer. "Pela espessura da pele do meu saco, aqui não nasce nem penugem, meus ovos vão ficar que nem os das codornas ", respondi. Ela pediu para olhar como estavam. Eu falei para olhar com meio metro de
distância e sem tocar em nada e se ficar rindo vai entrar na PORRADA!! Vesti a camiseta e fui dormir (somente de camiseta). Naquele momento sexo para mim nem para perpetuar a espécie humana. No outro dia pela manhã fui me arrumar para ir trabalhar. Os ovos estavam mais calmos, porém mais vermelhos que tomates maduros. Foi estranho sentir o vento bater em lugares nunca antes visitados. Tentei colocar a cueca, mas nada feito. Procurei alguma cueca de veludo e nada. Vesti a calça mais folgada que achei no armário e fui trabalhar sem cueca mesmo. Entrei na minha seção andando igual um cowboy cagado. Falei bom dia para todos, mas sem olhar nos olhos. E passei o dia inteiro trabalhando em pé com receio de encostar os tomates maduros em qualquer superfície.

Resultado, certas coisas devem ser feitas somente pelas mulheres.
Não adianta tentar misturar os universos masculino e feminino
Vão à merda...


PS.: Texto extraído de emails inuteis passados por amigos(as).

terça-feira, 4 de agosto de 2009

O Malvado deus - Episódio IV


O vôo do Airbus 350 da companhia Gol levava a lotação completa. Antes de iniciar a viagem, a aeromoça de bordo, uma loira de cabelo oxigenado onde as raízes pretas e crespas denunciavam a expiração do prazo de validade da progressiva, no meio do corredor, dirigiu-se a todos os passageiros:

«Atenção senhores passageiros, por favor… a viagem demorará cerca de duas horas, aterrizaremos no Aeroporto Internacional de Feira de Santana. Lá, na princesinha do sertão há muito sol e uma temperatura bastante agradável; agora, façam-me, ou melhor, façam-se um favor, ajoelhem-se e rezem duas ave-marias e um pai-nosso porque, apesar da experiência de vôo do nosso comandante, se alguma tragédia acontecer, o reino dos céus será o nosso destino.»
Entalado entre uma Testemunha de Jeová e Da Silva, Jesus de Deus desabafou:
«Não sei rezar, porra!»
«Mas finge que sabe, mexe os lábios e semicerra as pálpebras como se estivesses concentrado, assim ninguém notará a sua ignorância, entende?»
«Caralho!!! PqP!!!.»

Meia hora depois, o inspetor dava uma ligeira cotovelada no braço do seu ajudante.
«Você cuidou de tudo, né?»
Jesus sacou do bloco de apontamentos que consultou:
«Claro que sim… em Arraial D´juda estará Lúcifer, mais uns quantos amigos à nossa espera… e se levarmos a sério suas confidências, já não poderemos mais nos reunir na Arquidiocese de Salvador, porque o Ancebispo começa a andar desconfiado. Por outro lado, se somos descobertos, arriscamo-nos a ser assassinados pelos “secretas” da Opus Dei, na Bahia. A reunião foi alterada para o Rotary Club, uma instituição de todo o respeito dedicada à filantropia e onde nos sentiremos como se estivéssemos na nossa casa.»
«Que seja, então», replicou Da Silva e depois fechou os olhos e tentou adormecer.

Lúcifer era um tipo relativamente novo, vestia com gosto requintado e tinha uma linguagem fluente e simpática, até parecia um Mórmon. Na testa, indisfarçáveis, duas pequenas protuberâncias. Quando observou o olhar penetrante dos dois polícias, sorriu e justificou-se:
«Exato. São mesmo o que resta dos dois chifres que estavam implantados. Ainda fiz uma operação plástica mas, infelizmente, os cornos são como a barba, crescem e crescem, e tornam a crescer... acreditem-me ou não, todos os dias passo uma lima por cima. Enfim, é a minha sina!» Sorriu aberto e descontraído: «Fizeram boa viagem? Posso apresentar-lhes estes meus amigos que fazem questão de estarem presentes na nossa reunião? Todos têm contas a ajustar com o malvado deus.»

O inspetor observou os cinco personagens, esquisitíssimos que, entretanto, se aproximavam:
«Claro que pode, também nós ficaremos encantados por conhecê-los.»
Lúcifer voltou a sorrir, depois fez as apresentações:
«São Cipriano, famoso feiticeiro; Alessandro Cagliostro, ocultista e alquimista, estudou num seminário e depois num mosteiro beneditino, também se cansou de deus; Vlad Tepes, ou Vlad III, o Empalador, mais conhecido como Drácula; Paracelso, de seu verdadeiro nome Phillipus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, também alquimista e médico famoso; finalmente, Simão, o Mago ou o Gnóstico…»

Da Silva soltou uma sonora e irritante gargalhada:
«Que desgraça é essa, todos eles morreram há centenas de anos. Você está sacanagem comigo, é?»
Os olhos de Lúcifer faiscaram momentaneamente, só momentaneamente; depois, um sorriso doce animou-lhe as feições:
«Nada morre, meu caro, suponho que conhece a Lei da Conservação da Matéria, enunciada por um tal Lavoisier, um desgraçado que amava a monarquia, numa altura em que, em França, ser monárquico era um crime. Conhece? Então saberá que tudo se transforma, e que estes meus amigos, são apenas, tal como eu, representações, imagens, estereótipos... existimos sim, mas apenas nas suas cabeças, e só aí, entendem? Um poeta português escreveu uma vez: “Cada um é seus caminhos/ Onde Sancho vê moinhos/ D. Quixote vê gigantes/ Vê moinhos? São moinhos/ Vê gigantes? São gigantes.»
«Merda da filosofia de mesa de bar» pensou o inspetor, e depois deu uma palmada nas costas do outro:
«Claro que precisamos de vocês. O malvado deus anda matando ao léu, e temos de o apanhar. Vamos fazer a tal reunião?»
Todos riram em uníssono. Depois, conde Drácula, com voz fina, efeminada, explicou:
«Nunca perdoarei a deus, nunca! Era tão feliz quando estava com o meu preceptor…»
Lúcifer interrompeu-o para explicar:
«Drácula, realmente, tem razões de sobra para não gostar de deus. Adorava sugar sangue e outras coisas de rapazes virgens e inocentes. Deus enviou-o para um velho castelo na Romênia e deu-lhe uma esposa… Vlad III perdoou a deus por ter-lhe dado um reino; agora a esposa é que nunca o perdoará.»

***

Não perca o próximo episódio desta saga magnífica, onde nem tudo o que parece é. Os maus serão mesmo maus? E os bons, serão realmente bons? No próximo episódio tudo se esclarecerá, ou não, a ver vamos a disposição do narrador?!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

O Malvado deus - Episódio III


Da Silva de Deus atirou violentamente ao chão o relatório que o laboratório de polícia técnica lhe acabara de enviar.
«Já leste isto, Jesus?»
O agente acenou que não com a cabeça, e voltou a embrenhar-se no problema de palavras cruzadas que o jornal A Tarde trazia.
«Pois devias ler… o DNA da pena encontrada pertence mesmo a um pavão… só que a um pavão morto, mortíssimo, é uma pena com mais de cinco mil anos.»
«Que esperava o chefe? Achava que o arcanjo Gabriel tinha 20 anos? Ou trinta? O arcanjo é velho, chefe, velho pra caralho.»
«Não gosto quando você usa esses termos, meu caro, ainda mais aqui, no ambiente de trabalho… fica mal para um polícia, entende?»
Jesus riu. Gostava de chatear o superior e, sobretudo, gostava de o chatear de manhã.
«E em relação às impressões digitais do malvado deus, que foi conseguido?»
Da Silva continuava furioso. Antes de responder, aproximou-se da janela e observou a rua, cinzenta, porca, mas maravilhosa e plena de vida no centro de Itapuã.
«Temos milhares delas, mas, infelizmente, deus não tem cadastro… quer dizer, não temos o seu registro, nem a sua morada, nem a sua profissão, nem a sua idade, nada! Dele, só as histórias que os imbecis contam e estes crimes horríveis.»

Jesus fechou o jornal. Acabaria as palavras cruzadas lá mais para o fim da tarde, agora o trabalho chamava-o. Perguntou:
«E em relação aos marinheiros assassinados? Sabe-se mais alguma coisa?»
«Há uma nova pista que devemos explorar… os marujos eram todos homossexuais.»
Jesus assobiou longamente:
«O que significa que?» inquiriu.
«Vê onde pretendo chegar… deus matou em primeiro lugar um grupo de toxicodependentes, depois um grupo de homossexuais…ou seja, deus está a matar premeditadamente grupos específicos de indivíduos e não de forma aleatória como inicialmente pensei; se a minha idéia estiver correta, o próximo crime será executado contra alguém de quem as religiões, sobretudo a católica, não gostam. Começas a perceber?»
«Claro que percebo. Até podemos, antecipadamente, evitar que certas mortes aconteçam.»
«Fantástico Jesus, é isso mesmo! Se nossas premunições estiverem certas, estão em perigo os ateus, os comunistas, as prostitutas…»

O outro interrompeu:
«Os torcedores do Bahia…?!»
«Deixa de ser burro, Jesus.»
«Deus não gosta do Bahia, chefe, está provado, esse time não sai da 2ª divisão, e quando sai, volta pra 3ª…»
Da Silva continuava:
«As lésbicas, os ciganos, os pagodeiros, os chicleteiros…»
Jesus voltou a interromper:
«Eita porra, deus não gosta mesmo de ninguém.»

O inspetor estava mesmo entusiasmado. Acendeu um cigarro, abandonou a janela e fitou o seu subordinado.

«Há outra coisa que me tem deixado pensativo que é a imagem da senhora de Aparecida entre os corpos mutilados. Qual será a relação desta imagem, com os crimes?»
«Por que não marca um encontro?» perguntou o agente.
«Como?»
«A senhora de Aparecida, por esta altura, costuma estar ainda em Salvador, no Terreiro de Jesus. >
«Não me diga isso!?»
«Digo, sim, ora digo! Li esta notícia no Tribuna da Bahia desta semana.»
«Jesus, Jesus, todas as informações que temos relacionadas com este caso são importantes e deves comunicar-me imediatamente, por favor. Vá, vê lá se descobre o número de telefone dela e marca um encontro.»
«Um encontro com a senhora de Aparecida?»
«Sim, claro!»

As coisas começavam a avançar, pensava o inspetor. A comichão deixara de o apoquentar e, apanhar o malvado deus, começava agora a parecer-lhe tarefa mais fácil. Vindo da sala ao lado a voz do agente Jesus, sobressaltou-o:
«A dona Aparecida não pode atender-nos durante esta semana, pois diz que continua muito cansada, mas foi de uma simpatia extrema. Nos indicou a Lúcifer, irmão gêmeo de deus, que pode dar-nos algumas informações…»

«Lúcifer também está em Salvador? Isso é a terra do cão!»
«Infelizmente não! Está em Feira de Santana em comissão de serviço, mas podemos ter uma conversa franca com ele… o fulano é sócio honorário do Rotary Club Internacional.»

***

Não perca o próximo capítulo onde conhecerá o famoso Lúcifer e sua corte diabólica. Mas não só: novos e terríveis dramas irão, certamente, acontecer.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

O Malvado deus - Episódio II


Da Silva de Deus acendeu um cigarro e observou o colega, sentado à sua frente que, calmamente, comia um acarajé:
«Há novidades Jesus? O malvado deus já foi encontrado? Sabe-se ao menos onde estará?»
Em resposta, o agente abanou a cabeça negativamente. Respondeu com voz surda e monocórdia:
«As pistas são confusas, chefe. O malvado deus foi encontrado em vários lugares e sempre à mesma hora. Porra, com tantos álibis, vai ser difícil conseguir provar os seus tenebrosos crimes. Repare só: anteontem, às três da tarde, na Ribeiro; às três e cinco minutos em Cajazeiras; eram três e oito minutos e era visto fazendo compras na Baixa do Sapateiro, onde se fartou de dar autógrafos, sobretudo a um grupo de homossexuais cristãos que se reuniam na ladeira do Taboão…»
«Essa criatura tem o dom de está em muitos lugares ao mesmo tempo, Jesus… está presente em toda a parte, por isso, nem sei como o conseguiremos capturar?»
O outro riu com desusada desfaçatez e depois sacou de um enorme pistolão:
«Mas sei eu, chefe. Sei eu! Olhe só para esta beleza, uma VP70 da Heckler & Koch que, com um adaptador para ombro, pode fazer rajadas de 3 tiros. Quando vir deus dou-lhe uma chumbada nos cornos e depois, sempre quero ver esse dom da onipresença…»

O semblante de Da Silva modificou-se:
«Onde você conseguiu essa arma?»
Jesus deu uma longa tragada de chá, encheu o peito de ar, os seus olhos brilhavam anormalmente, quando respondeu:
«Conheço um oficial superior do exército que… que… quer dizer?!»
O inspetor esmagou a ponta do cigarro no cinzeiro e semicerrou os olhos:
«Entendo, Jesus, entendo!»

Foi então que o telefone tocou. O inspetor segurou o fone:
«Estou! Sim, sim, sim senhor, entendido… vamos já para aí.»
Pousou o telefone e levantou-se.
«Acaba o chá, Jesus! Deus voltou a matar. Vamos!»

Minutos depois, um helicóptero à serviço da polícia, levantava com destino a Candeias. Num petroleiro fundeado ao largo, o malvado deus assassinara dois marinheiros, mais o imediato e o terceiro maquinista… a técnica usada fora igual à anterior; retalhara-lhes os corpos com uma faca roubada da copa e, sobre os cadáveres, deixara a imagem da senhora de Aparecida.

Ao observar os corpos, Da Silva sentiu um leve estremecimento. Fechou os olhos e deixou-se ficar assim, por largos minutos, só os abrindo quando o agente o abanou levemente:
«Sente-se bem, Senhor?»
«Esta noite tive um estranho sonho, Jesus… um estranho e sombrio sonho! É como… como se soubesse que estas mortes iam acontecer… no sonho, o malvado deus desviava um navio, fazia reféns os seus tripulante e depois, com crueldade requintada, cortava-os e atirava-os aos tubarões… diabos, os bichos, enormes, rodopiavam vorazes em volta do navio, brigando pelo melhor bocado…»

Fez uma ligeira pausa que aproveitou para tirar o lenço Fo bolso. Limpou o rosto que começava a suar copiosamente:
«Mas há mais Jesus, há esta comichão invulgar nos testículos… há aqui algo de fantástico e tenebroso… sinto-o!»
Voltou a olhar os corpos. Nada de especial… só os cortes horríveis, as vísceras das vítimas espalhadas pelo 2º deck, o sangue que escorrera e formara uma pequena poça e depois, depois o grito do agente Jesus de Deus:
«Veja isto, chefe! Uma pena presa na antepara…»
O inspetor deu um salto:
«Que porra, uma pena! Que quer isso dizer?»
«Uma pena de pavão, chefe! O arcanjo Gabriel continua cúmplice do malvado deus.»
«Temos de a analisar no laboratório, Jesus. Guarda-a com mil cuidados e, já agora, verifica se o malvado deus deixou impressões digitais?»

***
Terá o malvado deus impressões digitais? E será fácil detectar ADN, nas penas do sinistro arcanjo Gabriel? E a comichão nos testículos do inspetor, será sinônimo de premonições futuras ou, muito simplesmente, resquícios de uma praga de piolhos da púbis, também conhecidos por “chatos”? Não perca o próximo capítulo, desta magnífica saga que começa a despertar enormes paixões e a criar profundas fendas no tecido religioso do país.


Por Franjhunio